Não bastasse o baque surdo do punho que me acertava em cheio o olho esquerdo, veio também um velho conhecido insulto:
-Filho da puta!
-AHHHHHHH! - respondi, de dor.
Fiquei estirado no chão por alguns segundos tentando entender o que havia acontecido e então entendi. Maria era mulher dele e eu não sabia. Ele, marido dela, era agressivo e eu também não sabia.
Tentei me levantar devagar, mas desisti. Percebi que meu esforço pra manter o copo de bebida intacto havia sido inútil. Alias, não inútil por completo, o copo ainda estava intacto, a bebida é que agora estava inteira em cima de mim. Justo na blusa novinha que Maria havia me dado. Igual à dele, por sinal. Talvez isso tenha me entregado.
-Levanta seu merda! - ele continuou.
-Me dê um minuto. - pedi.
-Ora, seu...
-Amor, pare! - gritou Maria, finalmente a meu favor.
-Como "pare", sua.. sua... Ora, não fuja! - gritou ele novamente quando me viu engatinhando em direção à porta.
-Desculpe, senhor. Eu não sabia! - confessei.
-Mentiroso! - e me chutou as pernas me fazendo cair de novo.
-Ele não sabia mesmo, amor! Juro! - Maria piedosa.
-Sua biscate!
-Hei! Não fale assim com a mulher que nos conquistou! - falei.
-Seu atrevido de merda!! Levanta daí! - gritou o marido.
-Não levanto! Tá doendo!
-Quer gelo? - perguntou Maria.
-Sim, por favor.
-Se for buscar vai ser pra sua cara sua puta! - falou o marido.
-O quê? - Maria puta.
-Eu quis dizer... - marido medroso.
-Eu vou embora, seu bosta!
-Não meu amor, me desculpe! Por favor, eu...
-Por isso eu o traí! Seu pau mole de merda! - Maria ofensiva.
-Não! Espera... - marido chorão.
-Ela foi embora! - eu, intrometido.
-Eu vou te matar! - e me pegou pelos cabelos.
-Calma, amigo! Calma! Ai que dor, filho da puta!
-Lá fora! Agora!
-Lá fora? Já chamamos atenção aqui dentro, por que levar isso pra lá? Vai estragar minha imagem nas ruas.
-Cale a boca!
-Não calo! Você vai me bater então eu vou te encher o saco!
Que fique claro que eu não estava realmente calmo, apesar da conversa deixar a entender que sim. Estava completamente desesperando, me debatendo feito louco, com um brutamontes me segurando pelos cabelos prestes a me mostrar que não era de fato um "pau mole" como a mulher havia dito.
-Reaja! Lute como um homem! - cuspia o cara.
-Não quero te matar! - respondi, me cagando todo.
-Me bate, seu merda!
-Me bate você, seu viado sem bolas!
Depois disso, me lembro apenas de acordar na rua, sem meus sapatos e sem minha carteira, com dois olhos inchados e uma dor de cabeça insuportável. Tenho quase certeza também que tinha cuspe no cabelo, ou cocô de pomba, talvez.
As pessoas passavam olhando pra mim, mas ninguém me ajudava, achando que eu era um mendigo ou um bandidinho qualquer. Levantei-me devagar. Procurei por algum trocado nos bolsos, mas nada. Nem um centavo, não me deixaram nada. Olhei para o bar em frente, onde tudo aconteceu. Entrei.
-Bom dia! - falei.
-Tem certeza? - perguntou o dono.
-Depende. O senhor vende fiado?
-Não.
-Então esquece, vai ser um péssimo dia.
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