quinta-feira, 12 de maio de 2011

A inevitável consequência do ser

Deito na cama e olho para o teto. Tem um buraco. Um buraco pequeno e mal feito, de algum vazamento talvez. Em volta, uma grande bolha escura e feia.

A inevitável consequência do ser é deixar de ser. Penso.

Quero compartilhar isso. Penso também. Gostaria de escrever um livro para compartilhar isso e tudo o que penso. Penso.

Se escrevesse, gostaria que meu livro fosse um bom livro, que não fosse um livro desses de estante. Talvez que retratasse um instante. Assimilo. Um bom instante, um momento da minha vida ou de alguma vida diferente.

Gostaria de inventar personagens para este livro, mas não tenho jeito com as palavras. Nem com as pessoas. Nem com os livros.

Eu mal leio pra dizer a verdade, imagine escrever. Argumento comigo mesmo.

Pego o último cigarro. Do maço. Definitivamente não da vida. A vida é longa demais pra eu dizer isso.

Passo entre os dedos. Cheiro. Apoio no canto da boca. Não acendo.

A vida é tão longa que fumo para encurtá-la. Não preciso de mais tempo do que já tenho. Penso. Repenso. Não preciso mesmo, não faço nada o tempo todo.

A não ser, ser. Isso eu faço o tempo todo. Sou o que o momento me pede. Sou filho, sou marido, sou pai. Sou eu.

Talvez devesse escrever sobre o meu ser em algum desses momentos. Seria um personagem, num instante da minha vida. Talvez alguém se interesse por isso. Ou não. Argumento de novo.

Acendo. Não penso em nada por um instante. Esqueço de tragar. Apenas encaro o buraco no teto. A visão embassa, o dia escuresse. Por um momento, inconsequente, deixo de existir. Por um momento, antes de voltar a ser o que sou, visito o inferno na consequencia intrinseca ao ser. Por um instante, deixo meu corpo pela terra descer. Deixo, por um instante, de ser. Assimilo. Permaneço assim por alguns minutos, talvez horas.

...

Volto a mim. Um novo ser.

Talvez eu devesse escrever sobre isso.

2 comentários:

  1. É disso que eu tô falando!
    Parabéns, meu querido. Que coisa linda...

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  2. Finalmente, não é mesmo? Fiquei tempo demais parado, precisava escrever um pouco...

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